Os homens dos “tempos trabalhosos” serão desafeiçoados | Pastor Cleber
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Os homens dos “tempos trabalhosos” serão desafeiçoados

A crise de afeição no seio familiar, e particularmente entre pais e filhos, revela que apesar de todos os avanços experimentados, nossa sociedade, ao contrário do que deveria, se torna cada vez mais iníqua

tristeza
Imagem: Pixabay

“Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos. Porque haverá homens amantes de si mesmos, avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães, ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores, incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons.” (2 Timóteo 3:1-3 — grifos do autor)


Pr. Cleber Montes Moreira


O homem dos últimos dias também será astorgoi (ἄστοργοι), “sem amor, sem afeição familiar, sem amor pelos parentes, destituído de amor por aqueles que naturalmente o exigem.”1 Russell Norman Champlin explica: “Trata-se da forma privativa de ‘stergo’, verbo que indica ‘amor mútuo’ entre pais e filhos, entre reis e seus súditos. A apostasia, que é a rebeldia descontrolada contra Deus, arruína até mesmo os sentimentos humanos naturais, transformando as pessoas em subseres humanos. Tal vocábulo se encontra somente aqui e em Rom. 1:31.”2

Muitas pessoas têm dificuldade para expressar afeição, mesmo aos familiares. Alguns foram criados num ambiente onde não receberam nem aprenderam a demonstrar afetos. A falta de carinho, seja por gestos ou palavras, tendem a gerar filhos insensíveis e desafeiçoados, e aqueles que não receberam, se não aprenderem de outro modo, terão dificuldades para ensinar aos filhos. A falta de diálogo construtivo, de elogios sinceros e declarações amorosas é um problema para a saúde e maturidade do indivíduo. Outro problema que coopera para isso é a rotina moderna, principalmente quando os pais precisam trabalhar muito, o que não lhes permite conviver mais tempo com os filhos. Além desses fatores, há também a influência cultural. Esses dias recebi uma foto pelo Whatsapp muito curiosa: Nela, um marido islâmico tira uma selfie com a esposa, ela de burca. Em certos países as mulheres são tratadas como objetos, e mesmo no ocidente, em alguns lugares, elas não são respeitadas e valorizadas. Igualmente, as crianças são tratadas com descasos em muitas culturas. Há países que, por causa de costumes religiosos, as meninas são mutiladas, vendidas e até dadas em casamento ainda na infância, e há casos de mortes durante noites de núpcias. Principalmente no ocidente a questão social exerce muita pressão, especialmente sobre os mais jovens, tanto quanto mais agressivo for o marketing de consumo: entre os adolescentes, por exemplo, para se sentirem iguais, ou serem aceitos em certos grupos, precisam usar certas grifes, ostentar smartphones de última geração, ter TV por assinatura, NetFlix, frequentar certos lugares etc., coisa que nem sempre os pais têm recursos para manter, o que desencadeia atritos. Outros desajustes sociais também cooperam para o “desafeiçoamento” entre as pessoas, tais como a violência, o consumo de drogas lícitas ou não, a influência nefasta da mídia, e todo bombardeio ideológico contra a família e os valores cristãos.

A crise de afeição no seio familiar, e particularmente entre pais e filhos, revela que apesar de todos os avanços experimentados, nossa sociedade, ao contrário do que deveria, se torna cada vez mais iníqua. Assim, a ausência de amor nos relacionamentos nada mais é que resultado do aumento da iniquidade. Jesus mesmo avisou: “E, por se multiplicar a iniquidade, o amor de muitos esfriará” (Mateus 24:12 — ACF).

Paulo, escrevendo aos Romanos, falando sobre a impiedade, diz sobre aqueles que, mesmo conhecendo o juízo de Deus, fazem e consentem o mal. Dentre outras coisas, eles são “desobedientes aos pais e às mães” e “sem afeição natural” (Romanos 1:30,31). Este comportamento se verifica claramente em nossa sociedade. Basta ligar o rádio ou a TV, ou ler alguns jornais ou sites de notícias para comprovar todos males gerados pelo ‘vácuo de afeto’: rebeldia, brigas, desacatos, violência verbal e física, e até atentados contra a vida. A falta de afeição tanto é causa, como causadora de desvios comportamentais.

No Portal “Ric Mais”, em matéria do dia 15 de julho de 2019, intitulada “Filho mata o próprio pai a marteladas dentro de casa, em Campo Largo”3, lemos que um homem de 30 anos assumiu a polícia ter matado o próprio pai a marteladas. O crime aconteceu na cidade de Campo Largo, região metropolitana de Curitiba. O idoso, de 64 anos, foi morto no dia 14 de julho, domingo, e foi sepultado no dia 15, segunda-feira, mesmo dia que comemoraria seu aniversário. No Recife, em 23 de julho de 2019, um pai matou o filho após uma discussão banal por causa de um celular. Um caso recente que chocou o Brasil, mas que não teve a devida repercussão na mídia (provavelmente por motivos ideológicos), foi o do assassinato cruel de Rhuan: um ano depois de ter seu pênis cortado, o menino, de apenas 9 anos, foi esquartejado pela própria mãe e sua companheira. Casos de brigas e assassinatos entre pais e filhos já é coisa corriqueira nas páginas policiais.

Danielle Brasiliense, em seu livro “QUANDO O FILHO MATA O PAI: as narrativas dos crimes de parricídio que abalaram o Brasil”4, Editora Multifoco, trata sobre “a repercussão midiática de crimes de parricídio ocorridos no Brasil desde a década de 70 até o ano de 2002, quando ocorreu o assassinato da família Von Richtofen.” Há estudos e matérias de profissionais de várias áreas que procuram dar a sociedade uma resposta mais adequada sobre o que tem motivado os crimes de parricídio5 no Brasil, cada vez mais frequentes. Creio que estas respostas não estejam apenas no contexto social, econômico, cultural, ou na psique, embora estes fatores colaborem para o desencadeamento da violência, mas, acima de tudo, na questão espiritual. Tanto mais o homem — individual e/ou coletivamente — se afasta de Deus, mais o pecado o domina e determina os seus atos. Todo mal que temos visto vem do “andar na carne”. Quanto mais as forças malignas avançam na desconstrução dos valores basilares da sociedade, e na construção de uma Nova Ordem social, mais em desordem fica o mundo. Uma sociedade cujos filhos são ensinados dentro de uma visão ideológica que defende a ideologia de gênero, o feminismo, o aborto, as drogas, que banaliza a família, despreza fundamentos etc.; que chama ao mal bem e ao bem, mal, ao errado certo e ao certo, errado, legitima não apenas o desprezo pelos valores judaico-cristãos, mas também a violência contra a vida, em todos os sentidos (Leia Isaías 5:20).

O problema é que este comportamento, notadamente entre os não conversos, está de certa forma também presente entre os que se declaram evangélicos. Nas famílias cristãs também pode haver falta de afeto, rebeldia, brigas, violência e até morte. Lembro, mais uma vez, que Paulo trata destes comportamentos entre os crentes, como sendo manifestações da apostasia da fé. Pessoas que se afastam da doutrina de Cristo, passam facilmente a andar em conformidade com o mundo.

A falta de afeto, além de gerar um sentimento de solidão (ainda que a pessoa não viva afastada dos familiares), pode acarretar vários transtornos, inclusive doenças psíquicas mais graves, como a depressão. Para reverter este comportamento é preciso saber amar, perdoar e investir no relacionamento.

Lembremo-nos que uma família é formada não apenas pela relação de sangue que os membros têm, mas também pelos laços afetivos que se estabelece entre eles. É por meio da conversa, do toque, do abraço, do beijo e outras demonstrações de afeto, bem como das experiências e ideais em comum que o vínculo entre as pessoas é fortalecido. No caso da família cristã, a fé em Cristo e a observância das Escrituras, coisas que as famílias comuns não têm, criam um ambiente propício para a boa convivência e fortalecimento de vínculos. Hábitos como oração em família, leitura bíblica, louvor a Deus, ações de graças, ir juntos ao templo etc., cooperam para o crescimento, fortalecimento e defesa da família diante das intempéries da vida. Isso porque “Se o SENHOR não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam” (Salmos 127:1).


1 Rienecker, Fritz – Rogers, Cleon. Chave linguística do Novo Testamento grego, página 477, Vida Nova, São Paulo-SP, 1985.

2 Champlin, Russell Norman, Ph. D., Comentário Bíblico, Volume 5, páginas 386 e 387, Hagnos, 2001

3 https://ricmais.com.br/noticias/filho-mata-pai-a-marteladas/ (acessado em 12 de agosto de 2019)

4 https://editoramultifoco.com.br/loja/product/quando-o-filho-mata-o-pai-as-narrativas-dos-crimes-de-parricidio-que-abalaram-o-brasil/ (acessado em 12 de agosto de 2019)

5 Assassinato do pai, da mãe, do avó, da avó ou de qualquer outra figura parental; crime que se configura a partir desse assassinato; crime cometido por um parricida: adolescente é condenado por parricídio. Fonte: Dicio.

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