A religião dos “amantes de si mesmos” | Pastor Cleber
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A religião dos “amantes de si mesmos”

Mais que pelo entendimento errado das Escrituras, que pela falta de uma hermenêutica correta, a apostasia da fé deste tempo é fruto do amor que contempla os interesses pessoais, que alimenta a ganância, que coloca o ego como centro da adoração do sistema religioso humano

narcisismo
Imagem: Pixabay

“Porque haverá homens amantes de si mesmos…” (2 Timóteo 3:2)


Pr. Cleber Montes Moreira


Enquanto o amor se esfria no mundo em decorrência da multiplicação da iniquidade (Mateus 24:12), o amor sincero, altruísta, um outro tipo de amor se estabelece cada vez mais como marca de uma geração corrompida e cada vez mais distante de Deus. Falo do amor ao qual se refere Paulo ao dizer que os homens dos “tempos trabalhosos” seriam “amantes de si mesmos”.

Este amor — amor egoísta, que busca saciar os deleites da carne — parece ser a força propulsora de uma apostasia da fé jamais vista na história. Ele move tanto aqueles que procuram os benefícios dos falsos evangelhos quanto os falsos profetas que providenciam meios para atender às demandas do mercado da fé. Os primeiros estão sempre em busca da cura, do milagre, do emprego, da prosperidade, de trazer de volta o amor que se foi, de desfazer algum “trabalho de macumbaria”, de legitimar seus pecados, e outros favores e vantagens, enquanto os últimos — movidos pelo mesmo amor — ofertam soluções e fazem promessas em troca do que lhes interessa, quase sempre o dinheiro, o poder e o status. É assim que por meio deste amor multidões com comichão nos ouvidos, não suportando a sã doutrina, constituem para si líderes segundo seus próprios interesses, os quais, por sua vez, e porque são carnais e não espirituais, passam a mercadejar a Palavra em benefício próprio (2 Timóteo 4:3; 2 Pedro 2:3; 2 Coríntios 2:17).

Aqueles que amam a si mesmos acabam se tornando “sologâmicos”, ou seja, casados consigo mesmos, com seus interesses e caprichos. Eles fazem juras de amor e prometem ser fiéis a si mesmos na busca da satisfação pessoal, muitas vezes ao custo da honra, da desconstrução da família, em detrimento dos interesses e bem-estar do próximo, e do afastamento de Deus.

Mais que pelo entendimento errado das Escrituras, que pela falta de uma hermenêutica correta, a apostasia da fé deste tempo é fruto do amor que contempla os interesses pessoais, que alimenta a ganância, que coloca o ego como centro da adoração do sistema religioso humano; também nos arraiais evangélicos onde quase tudo converge para o homem. Basta uma análise simples das canções gospel, das mensagens proferidas por “encantadores de pecadores” (como chamo certos pregadores), e dos eventos que atraem multidões de “adoradores” para que se perceba onde está o foco. Nestas celebrações marcadas por rituais hedonistas, a adoração é dirigida ao (in)fiel — tudo é preparado para ele, para o seu prazer, para a sua exaltação.

Os profetas do engano são os ateus modernos: oportunistas de plantão, que falam em nome do Deus no qual eles mesmos não creem — porque se cressem teriam temor —, que usam a Bíblia apenas como pretexto e meio para conquistar a confiança dos incautos, que ostentam autoridade e poder espiritual, mas vivem na carne; ele são os “inimigos da cruz de Cristo, cujo fim é a perdição; cujo Deus é o ventre, e cuja glória é para confusão deles, que só pensam nas coisas terrenas” (Filipenses 3:18,19).

Seja o helicóptero decolando de um heliponto de um mega templo em São Paulo, cheio de malas de dinheiro, a portinha de um templo de uma seita qualquer num bairro pobre, os frequentadores das correntes dos empresários, ou os pobres que procuram na religião alguma solução, parece que todos são movidos pelo mesmo amor que busca os próprios interesses.

O encontro dos “amantes de si mesmos” — de um lado os (in)fiéis que procuram um deus que corresponda aos seus desejos temporais, do outro os mercadores da fé que despudoradamente adéquam o evangelho aos anseios dos ouvintes — cria um ambiente favorável aos desvios, onde o amor-próprio passa a ser o fator gerador da apostasia da fé. Deste encontro de interesses (e interesseiros) que surge a necessidade de teologias moldáveis que correspondam às expectativas e contemplem a diversidade, que seja capaz de apresentar um deus serviçal, multiforme e representativo das mais diversas correntes de fé, de tradições e de comportamentos; um deus criado à imagem e semelhança dos homens. A Teologia da Prosperidade, o Evangelho Social, o Evangelho da Confissão Positiva, o Triunfalismo Gospel, a Teologia do Coaching, a Teologia Inclusiva (também chamada Teologia Queer e Teologia Gay) e outros desvios são apenas alguns dos meios pelos quais este deus se revela. Nada mais funesto, mais anticristão, que esta religião que fala de Deus, mas é, em sua essência, antropocêntrica — a religião dos “amantes de si mesmos”.


Fevereiro de 2020

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